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Programa Nacional de Alimentação Escolar: Uma Visão Geral

O Programa Nacional de Alimentação Escolar – PNAE é um dos pilares da política pública brasileira voltada para a segurança alimentar e nutricional de milhões de crianças e adolescentes na rede pública de educação básica, sob a coordenação do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação – FNDE.

O PNAE não se limita a garantir refeições nutritivas para os alunos da rede pública; ele também está alinhado aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável – ODS, uma agenda global que visa promover o desenvolvimento econômico, social e ambiental de forma integrada. Assim, esse texto tem alinhamento às ações de combatem a fome (ODS 2), promoção da saúde e o bem-estar (ODS 3) e fomentam práticas sustentáveis na produção e consumo de alimentos (ODS 12), tanto quanto o combate às alterações climática (ODS 13). O PNAE contribui diretamente para o alcance dessas metas. Dessa forma, o Programa reforça seu papel não apenas como uma política pública de alimentação escolar, mas como um motor para o desenvolvimento sustentável do país.

Além de sua importância histórica e dos impactos diretos na alimentação e saúde dos alunos, o PNAE também se alinha a compromissos globais, como ODS. Essa conexão fortalece ainda mais o papel do Programa ao posicioná-lo como uma iniciativa que não apenas combate à desnutrição e melhora o desempenho escolar, mas também contribui para desafios globais, como a erradicação da fome, a promoção da saúde e o incentivo a práticas sustentáveis na produção de alimentos.

A criação da Alimentação Escolar foi em 1955, seu o primeiro pilar, continuamente aperfeiçoado, refletindo as necessidades e desafios de cada época. Com uma longa trajetória, o Programa desempenha um papel essencial na promoção da saúde dos alunos, do rendimento escolar, e no fortalecimento da agricultura familiar.

O PNAE nasceu em um contexto de pós-guerra, com o objetivo inicial de combater a desnutrição entre crianças em idade escolar. Inicialmente, a distribuição de alimentos focava principalmente as regiões de maior vulnerabilidade. Na década de 1970, o Programa passou a cobrir todo o território nacional, abrangendo crianças da educação infantil e ensino fundamental. Mais tarde, em 2009, foram incluídos o alunos do ensino médio e educação de jovens e adultos (EJA) das escolas públicas.

A década de 1990 marcou um período de significativas reformas no PNAE, com a descentralização da gestão do Programa para os estados e municípios, sendo o segundo pilar das implementações. Essa mudança permitiu uma maior autonomia e adaptação às realidades locais, com a inclusão do nutricionista no Programa, favorecendo a inclusão de alimentos regionais nos cardápios das escolas públicas. Além disso, a legislação foi aprimorada para garantir que a alimentação fosse adequada e saudável, respeitando as necessidades nutricionais dos estudantes.

O PNAE tem como objetivo central garantir aos alunos, o direito humano à alimentação adequada durante o período escolar, contribuindo para o crescimento e desenvolvimento biopsicossocial dos estudantes, além de fortalecer o rendimento escolar e promover hábitos alimentares saudáveis. Para alcançar esses objetivos, o Programa segue um conjunto de princípios fundamentais, quais sejam:

  1. Universalidade e equidade: o PNAE é destinado a todos os alunos da rede pública de educação básica, garantindo que todos tenham acesso a uma alimentação adequada, independentemente de sua condição socioeconômica.
  2. Qualidade nutricional e alimentar: os cardápios devem ser planejados por nutricionistas, considerando as necessidades nutricionais dos estudantes em cada fase do desenvolvimento, respeitando a diversidade cultural e alimentar local.
  3. Sustentabilidade: o Programa incentiva a inclusão de alimentos orgânicos e da agroecologia, especialmente aqueles advindos da produção familiar rural, promovendo a sustentabilidade ambiental e o desenvolvimento econômico e social local.

Com o Marco legal e diretrizes operacionais estabelecidos pela Lei 11.947/2009, o terceiro pilar nas mudanças do PNAE, veio acompanhado por uma série de outras normas e regulamentos legais. Esta lei estabelece que estabelece a obrigatoriedade de utilizar, no mínimo, 30% dos recursos repassados pelo FNDE para a alimentação escolar, na compra de alimentos da produção familiar rural.

A Lei 11.947/2009 estabelece em seu artigo 6º que o FNDE deverá normatizar a execução do PNAE. Por sua vez, o FNDE determina através do artigo 15 da Resolução FNDE 06/2020 que Art. 15 coordenação técnica do PNAE “deve ser realizada por nutricionista Responsável Técnico – RT” conforme as atribuições definidas do Conselho Federal de Nutrição. Atualmente essa definição é dada pela Resolução CFN 465/2010 que será em novembro/2023 pela Resolução CFN 788/2024.

A presença do nutricionista no PNAE é obrigatória e essencial para o sucesso do Programa, e entre as atribuições definidas a esse profissional pelo CFN, traz inclusive a responsabilidade por planejar cardápios que atendam às necessidades nutricionais dos estudantes, levando em conta fatores como faixa etária, nível de atividade física, e condições de saúde. Além disso, o nutricionista deve realizar a supervisão técnica das unidades de alimentação escolar (cozinhas escolares), garantindo a qualidade e a segurança dos alimentos fornecidos.

Outra atribuição importante do nutricionista é a promoção de ações de EAN, que buscam sensibilizar a comunidade escolar sobre a importância de uma alimentação saudável. Essas ações são fundamentais para a construção de hábitos alimentares positivos, que podem ser mantidos ao longo da vida.

Cabe ressaltar a importância do nutricionista concursado. A efetividade do PNAE depende, em grande parte, da estabilidade e continuidade do trabalho realizado pelos nutricionistas na gestão técnica da alimentação escolar. Nesse contexto, é fundamental que esses profissionais sejam contratados por meio de concursos públicos, cumprindo às determinações do artigo 37 da Constituição Federal, em vez de contratos temporários que, infelizmente, ainda ocorrem em alguns municípios por meio de processos seletivos, pregões ou chamadas públicas.

Nutricionistas concursados garantem um vínculo estável com a administração pública, permitindo o planejamento e a execução de políticas de longo prazo, além de assegurar uma maior independência técnica e imparcialidade nas decisões. A rotatividade e a precariedade dos contratos temporários podem comprometer a qualidade do serviço, resultando em descontinuidade na elaboração dos documentos técnico, imprescindíveis na gestão, no atendimento, vínculo com a comunidade escolar, na implementação de ações de EAN que são essenciais para cumprir o objetivo e diretrizes do PNAE.

Diversos estudos têm demonstrado os impactos positivos do PNAE na saúde e no desempenho escolar dos alunos da rede pública de educação básica. O fornecimento de refeições nutricionalmente equilibradas e sanitariamente seguras, contribui para a redução da desnutrição e para a prevenção de doenças crônicas não transmissíveis, como obesidade e diabetes. Além disso, há evidências de que a alimentação escolar adequada melhora a concentração e o rendimento dos alunos, refletindo em melhores resultados no aprendizado deles.

O PNAE também desempenha um papel importante no combate à fome e à insegurança alimentar, especialmente em regiões mais carentes do Brasil, onde a alimentação escolar pode ser a principal ou única refeição completa do dia para muitos alunos.

Apesar dos avanços, o PNAE enfrenta desafios que exigem constante atenção e inovação dos gestores públicos. O respeito ao posicionamento técnico do nutricionista, a providência da estrutura geral adequada como a equipe administrativa, técnica e operacional, espaço físico para a armazenagem, preparo e distribuição das refeições, a logística de distribuição de alimentos em um país de dimensões continentais, a necessidade de diversificação dos cardápios, e a EAN no currículo escolar saudável são alguns dos principais obstáculos. A inclusão de alimentos regionais, orgânicos, da agroecologia e da agricultura familiar rural, também requer uma articulação eficaz entre os diversos atores envolvidos, desde os produtores, nutricionistas, autoridades máximas (prefeitos e secretários de educação) até o prato dos alunos.

O futuro do PNAE depende de atenção dos gestores públicos, especialmente os da alta administração, da sua capacidade de cumprimento às novas legais que demandam ações à área, fortalecendo a presença dos alimentos saudáveis, seguros, sustentáveis. Parcerias com outros setores, como saúde e assistência social, também são fundamentais para ampliar o impacto do Programa.

O PNAE é uma iniciativa de grande relevância para o Brasil, garantindo a alimentação de milhões de alunos da rede pública de educação básica e, promovendo o desenvolvimento local. A gestão eficiente do PNAE, com atenção dos gestores públicos e conduzida por profissionais capacitados e comprometidos, como os nutricionistas, é essencial para que o continue a cumprir seu papel na construção de uma sociedade mais saudável, justa e consciente.

REFERÊNCIAS

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